quinta-feira, 17 de março de 2011

OS SACRIFÍCIOS DA PATERNIDADE

moisés, o árduo desempenho de ser pai
É terrível a provação que me espera esta manhã: conviver com os mais pais da creche da Jade. Ainda por cima mete jogatana de futebol. A esta hora fui incluído numa equipa dum torneio qualquer. Esta gente não convive sem umas caneladas ululantes e incentivadas pela excitação dos filhos. Não se pode conviver em torno de umas castanhas e uma água-pé, enquanto se recitam os poemas de amor do antigo Egipto? Se fosse na minha cidade ainda nos poderíamos entreolhar, avaliando o que o tempo tinha feito à estampa de cada um - olha-me o camafeu em que aquela se tornou, meu deus como ele era bonito e o estrago em que ficou. Mas a dez mil quilómetros, sem ter partilhado a infância com nenhuma destas criaturas, só me resta ser avançado centro. Será que lhes conseguirei contar a minha velha aspiração de ser o melhor suplente do mundo? De ser contratado pelo Real Madrid e lá fazer carreira, sempre convocado mas sem nunca sair do banco - até ser classificado como o melhor suplente do mundo? Vamos lá a ver se consigo contar-lhes a história antes da constituição das equipas. E que em alternativa ao futebol não me coloquem nalgum torneio de xadrez! Seria uma vergonha para a Jade. Nunca ganhei um jogo de xadrez na vida, até a minha mãe, perdida de sono, me ganhava. Uma vez estive com dois peões de avanço e um bispo e ao cabo de meia-hora de dolorosa espera propus ao meu adversário: se quiseres levas o tabuleiro para a cama, gizas a jogada e amanhã retomamos. E replica-me ele: não pá, és tu a jogar! E fiquei tão atrapalhado com a minha desatenção que perdi logo em quatro lances. Pior então é no ténis, o ténis é uma modalidade para tipos muito supersticiosos, eu acho. É a única coisa que explica a graça de um jogo em que um jogador pretende dar a bola ao adversário e este tem a invariável indelicadeza de a devolver. Ao menos no futebol tenta-se tirar a bola ao outro, no ténis não, eu passo a bola ao meu adversário que malcriadamente a rejeita, como se estivesse amaldiçoada.
O meu gato espreita o teclado por cima do meu ombro, parece concordar com tudo o que eu digo. Hoje vai ser uma manhã terrível – se sobreviver dou-vos sinal.
A única coisa boa desta manhã é que ao regressar, moribundo está claro, já devo ter Internet à la carte e à la maison.

1 comentário:

  1. Aposto que subiste na consideração da Jade. Ela nunca te viu a fazer exercício físico.

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