sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

POEMA DE NATAL PARA O PAULO MIRANDA E O COTRIM

                                                           miró, cão latindo para a lua


Sente-se de repente a meio duma frase
que estamos em convalescença
e um bosque avança no eco da casa

em sete divisões que a luz decompõe
como se fossem as serrilhas deste selo de Veneza
que martela no coração fatigado uma viagem por fazer

a viagem por fazer,
a vida por achar num caminho desimpedido
de chaminés de mármore preto.

Podia ser verão a meio desta linha
que a vida transformou numa longa carta
esquecida na cómoda que foi a leilão.

Somewhere, o lento processo de decomposição
do outro, tão inábil em admitir
que o lugar dos bolsos era o púbere desejo do mar,

avança, inexorável, mas paralelo à exaltação
quase imperceptível com que o túmulo
mudado em balaustrada sobre a desova dos salmões

se cala para não dispersar a vida -
porque só é irremediável a manhã
em que não fizemos amor.

A meio deste instante recebi um mail
a falar-me duma sombrinha chinesa
esquecida no miolo dum passaporte

roubado e que reapareceu em Curibita,
segundo o informe que recebi da polícia local.
Foi o inédito da sombrinha, assegura

o comandante Matias que os impeliu
a procurar-me num reenvio transatlântico.
Milagres para um gentio

que ao contrário dos reis magos nunca pernoitou
no Hotel de La Vallée, onde, dizem
que uma estrela faz cirurgia a um planeta

já descrente de que haja rapazes de olhos cor-de-rosa.
Por isso me parece a vida mais simples
do que antes: já não sou o guarda da prisão

e a alegria começa no puré de castanha
e nos salpicos de sal a meio de um umbigo
donde despontam petroleiros e uma asa

do mamilo que desenha um fio de sangue
na nossa boca. E já não passa a horas fixas
o comboio mas sei que ele passa

e me transporta aos jardins submarinos
do Niassa e aos rigores da criança que nos vê,
bêbados, e cruelmente mijados de compaixão.

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

BRAILLE: CATANDO CADERNOS/1

                                                        vasco manhiça, pintor moçambicano

DOS JORNAIS
Mafalala blues: quando viu o puto de onze anos
enforcado na mafurreira das traseiras
foi tocado pelo desespero: afinal, nada, nunca,
mudaria na penúria da sua vida. Até
o secretário do bairro era o mesmo
inútil há trinta anos. Ele vira,
o miúdo topou tudo num relance.
Aquele suicídio confirmava:
tinha a consciência vegetal dum songamonga.


VALA COMUM, SINOPSE:
O estranho plano para férias de Licurgo, o primeiro depois do seu divórcio, aos quarenta e três anos:
- dar a volta à casa, arrumar papéis, livralhada, catar os cadernos velhos (guardava-os desde o ciclo, nunca deitando nada fora), coligindo as cintilações dispersas por mil canteiros (sempre quisera ser escritor mas nunca passara da primeira página nas milhentas histórias que esboçara),
- e dar vazão à curiosidade telefonando para os quinhentos números de telefone que amealhara de nomes que lhe pareciam agora anónimos, mergulhados na vala comum.



Não me lembro donde tirei esta frase mas acho-a magnífica: “o que me arrepia no cristianismo é a ideia desse Deus que poderia amar-me a mim!” De facto, que pobreza de espírito!



A fogueira deitou-se
Para que a noite estrelada
Se pusesse em bicos dos pés.


“Éramos como navios que se saudavam em alto mar, cada qual baixando a sua bandeira”, escreveu Jung, com grande compreensão da alma humana. E o afecto desata-se quando num pequeno escaler os tripulantes se visitam momentaneamente e confirmam: a vida é o amor da vida.



O seu olhar é como o fogo que carcome intimamente todos os campos de trigo que a placidez duma vida amealhou, mas eu já não estou virado para escaqueirar a minha vida num gesto, no gesto. Por isso quando voltou a espetar os mamilos na direcção das minhas íris e insistiu:
         «professor, se eu tiver treze dispensa-me de exame, não dispensa?»
eu atalhei:
        «Não!».



Creio que a evidente racionalidade que fui adquirindo, como uma conquista árdua com mortos e feridos nunca me fará descrer do mistérios, da experiência, infelizmente intermitente, em âmbitos transpessoais.



PARA DISCURSO DE UM POLÍTICO, NUM CONTO:
«o problema em África é que o pobre não é nosso – é de outro. É o pobre do outro. Das organizações humanitárias, dos direitos humanos, da opinião pública ocidental (isto é, dos países que nos colonizaram), da Unesco, não é nosso.
Daí que a minha proposta seja: que cada branco adopte um negro!»



O Museu do Prado apresenta a mais antiga cópia da Mona Lisa. Há que fazer um Museu com as mais novas cópias das telas famosas.



Consideram-se os ossos palustres
Quando acima deles
Ainda sonha a carne.



CRÓNICA SOBRE UM CERTO PASTOR DE INCERTA SURDEZ

A sua esposa pintava as unhas de amarelo
para se lavar da ausência de pecados
e exibia-as ao almoço, ao pôr-lhe a terrina
de arroz à frente dos olhos. Alardes

& Sacrifícios em vão – ele não erguia
os olhos do seu decoro mumificado.
A chuva é um rio que se partiu,
já não lembro onde li,

no caso dele o rio partira-se nos mil
cacos da banheira onde colidira
o meteoro da abstracção.
Ela tentara já outras abordagens,

depilara-se, aprendeu o cha cha cha.
Era inútil saracotear-se como Salomé
na sua presença, só quem acreditasse
na ressurreição ao quarto dia.

Quanto à sombra dele padece de diabetes,
como todas as que se vão fixando
na glabra conversa
do boletim meteorológico.

Por isso bocejam os coretos e os cultos
por onde passa: perpassa-lhe
em cada palavra uma freira seca
como a virilha de um gnu.

Mas todo ele é fé,
da unha ao bolor
que lhe tomam as laranjas
no cesto da cozinha.

Todo ele se desdobra em petições, cego
ao espaço que gota a gota
nos penetra. Ainda que haja
deuses para tudo, e a boca

possa acolher a glória dos temperos,
concluiu finalmente a sua esposa
em casa de Marcolino Tembe
onde fora ver um sacrário de marfim

e surpreendeu um viçoso botão de rosa
a meio dum corpo enxuto: pátrias há,
como o Desejo, que não cabem
na pequenez da carne, e se enlaçam

em pequenas cadeias e sismos. É o escândalo
da semana no meu bairro. E o pastor
repete, alheando-se dos gemidos que ouviu:
«O ouvido é o que mais tende à surdez!»



«Há o homem e há também a omelete…», garantia Lacan.



Braille: um bom nome para um volume que me antologie a poesia.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

HOMENAGEM A VIRGÍLIO DE LEMOS EM DOIS ANDAMENTOS

                                                                             tapiès


Um filme que o Virgílio de Lemos adoraria:

1
Com o habitual atraso que me dá “o exílio” vi esta noite L’Amour, de Michael Hanek. Um filme que hoje seria impossível de ser feito nos EUA e que, por reconhecimento dessa vergonha, só poderia ter ganho o Óscar do Melhor Filme Estrangeiro.
Há claramente um texto a fazer sobre as relações subterrâneas entre este filme e Viagem a Tókio, de Ozu, no que toca a uma idêntica visão do que seja a dignidade de “desaparecer” deixando que o fluxo da vida permaneça intacto - de que a música e a sua persistência pelas “bagatelas” (para glosar a sonata de Beethoven que “enche” o filme) que cada interpretação traz é aqui a metáfora.
Há vários momentos extraordinários neste filme sóbrio e justo, que me faz lembrar uma frase memorável de Camus: "sofrer não te dá direitos", mas quero referir-me a três:
- a cena inicial do concerto musical, onde Hanek nos mostra a plateia em vez do palco, com o casal de idosos protagonistas já anónimos no meio da mole humana, o que imediatamente nos diz que o drama a que vamos assistir é transitivo e há de desencadear-se em cada um de nós, no seu momento próprio;
-  a cena que começa quando o marido num acto de vida esbofeteia a sua acamada mulher que, em querendo morrer, rejeita a água que ele carinhosamente lhe dá, e se desdobra numa sequência de pinturas bucólicas (as que pontuam nas paredes da casa) nos quais a figura humana se vai gradualmente diluindo na paisagem, até se tornar invisível ou rarefeita, como um efémero sinal entre dois infinitos: o da escarpa e o do mar do quadro final;
- a cena do pombo, quando Trintignant no afã de agarrar a vida e de a sentir pulsar entre as mãos, o abafa (com uma manta) como havia feito com a sua mulher (com a almofada) ao dar-lhe a morte (horror que neste filme é uma forma de dádiva), simetria ambígua em que se joga toda a complexidade do amor e da vida.
Três momentos fortes de um filme que merece os encómios de que vem laureado.

 2


O Virgílio de Lemos, homem de naturaleza "leve", matérica, que nunca conheci pessoalmente (- ele em Nantes e eu em Maputo, a falta de taco nunca nos deixou cumprir a vontade profunda de nos conhecermos) mas com quem troquei centenas de emails, alguns divertidíssimos, para concretizarmos a antologia dele que preparámos juntos, A Invenção das Ilhas, era um homem que ria da metafísica para lhe opor os acenos da sensualidade e do riso, e gostava de uma boa irreverência. Por isso, ao arrepio já das solenidades, que ele odiaria, lhe dedico esta pequena narrativa que escrevi ontem:


A LIÇÃO DE HISTÓRIA

Depois de bater uma boa sorna, nada como acordar com a Sónia ao nosso lado a bater-nos uma punheta.
A Sónia tem seis dedos em cada mão, como de resto os teve el-rei dom Sebastião, e é vão querer saber se isso lhe dá uma tactibilidade especial ou se será da fantasia que a sua anomalia provoca em nós, o certo é que somos quatro a testemunhar o mesmo facto: "aprés" uma punheta batida pela Sónia ficam-nos a doer os colhões.
Eu tinha comprado uma rede, em Fortaleza, no Brasil, onde fiz uma exposição de fotografias cuja receptividade foi nula, e habituara-me a bater um choco todas as tardes depois do almoço, não mais do que uma hora para não ficar mole. Ontem, convidei a Sónia para almoçar, preparando-a para a sessão de nus que iríamos fazer no estúdio à tarde. E perguntou-me ela, como me vais pagar isso. Na brincadeira, olhando-lhe as mãos, respondi, com uma pívia. Para surpresa minha, isso provocou-lhe um sorriso mais aberto que a calvície do Yul Brynner. Adoro mostrar os meus dons, justificou.
Do vinho passámos à sonolência, na rede, até que ela, com a precisão de um metrónomo, uma hora depois, quis justificar a fama.
Nunca lhe serei suficientemente grato, ela foi buscar o ouro a 50 m de profundidade, ainda que me tivesse deixado o cavername a zunir. Confirmo o que dela me foi referido pelos três amigos comuns que desfrutaram duma idêntica experiência angular. A quem não acreditar que da associação duma boa sorna com a Sónia possa nascer um deleite que é em si mesmo uma arquitectura da dor, a tais cínicos, lembro o aviso de Jim Harrison: (também) a morte tem para nós a inverosimilhança que terá a realidade da nossa viagem à lua para uma zebra - a morte que, em nosso nome, já faz uma batida.

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

BAGAGEM À VENDA EM LISBOA

 
ESTÁ À VENDA NA GALERIA DA ABYSMO - Rua da Horta Seca, 40 R/C – 1200-221 Lisboa | info@abysmo.pt, A CEM METROS DO CAMÕES.
A PARTIR DA PRÓXIMA SEMANA

domingo, 1 de dezembro de 2013

BAGAGEM NAO RECLAMADA/LADRILHOS 2. O HUMOR

 
 

 
Se em 180 páginas de sonetos não houvesse, para além da marmelada, uma pitada de humor a atenuar tanta meditação sombria, o pataco de um lirismo de malha caída, não sei que vos diga.

Por isso de vez em quando:
 
 

Desabotoada a calça,
o poema relaxa,
como o guarda na guarita
que vê a manhã dourar

lama, folhas, os estalidos
que lhe amotinavam
a noite. Aceita
então de bom grado

um cálice, algo
que o distraia da missão
cumprida. O ventre

descai, engasta-se
no débito da rola:
rô rô rô Rõ (é fêmea…)

Mas aqui vos deixo outros ladrilhos, e vejam lá que a meio até tem blandícias:


 
de «Fala do Efebo/ reminiscência 2»


Onde é esconso

desenha uma baía.

Eu que não fui donzela,

ave ou eucalipto,


sequer a surda sarda

de Empédocles,

fui a Greta de Heraclito.

(…)



Sim, quando

a sílaba de Heraclito

remove a falta, liso, sim,

o fogo encrespa na pele,


lisa como a pantomima

num olho de lúcio. E a onda

que era hirta deflagra

 
em seda – vaivém e

tremula: ou antes ,

vai e goza.


 
(…)
       Outros vinham bêbados,

imprecisos, ele chega lúcido

como a pedra no sapato –

mas tudo que extrai é sem dor.


A volúpia de poder ser

tantos e ser de um

a cereja na orelha,

ramelosa Greta sem Garbo.

π

 

 

O coração tem o desleixo das vizinhas

que penduram roupa empapada de lixívia

sobre os colarinhos quase enxutos, sob

a almas quase despojadas de lascívia.



π

 

 

                            (…) A palavra

conspícua que desabotoou

 
a mini-saia à rapariga num lavabo

do estádio, perdia o Benfica por 3-1,

para que um sáurio desaustinado

lhe arrancasse do sexo a saxífraga.

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O que destilam areias? Com fria malícia

galopam para o mar. Na mira de um vínculo,

talvez de um rabo de sereia (será carne branca

ou vermelha?) que resguarde do vento.


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A vida são as luvas da morte, cismou,

e a mostarda subiu-lhe ao nariz. Espojada

a reputação na erva fria, quis esbofeteá-la,

 
mas o mundo está à pinha de intrusos

que nos distraem. Saiu do café com a sensação

fruste de ser um oráculo naif, se tanto,

um licor fino. Chegado a casa escreveu:

 
«Este verso é mais infalível que o Papa!»

Ah, ser ao menos traduzido em islandês,

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(…)

Na ignorância de que grua seja a fêmea do grou

anela-o a acústica do copo:

se percutido, zumbe. Com vantagem –

ainda que a teia pareça uma bela mandala,


as mandíbulas do predador não dizem om.

Cem por cento pela litania dos telemóveis

nas mãos das raparigas. Vai outra caneca?


Topas a romena? É tramada, mas ,

hóspede da beleza,

nela tudo é fulvo e acontece.

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(…) Nem a faxina

cumpre: vê-se pela enorme teia

que a sediciosa criatura

se ilustrou nos três bichos-de-prata

que roíam a velha edição

de Racine (isto é que é socialismo!).


π

 

 
Lês: «Beijo-a. Aqui

não seria fortuito um eclipse».

E chega dos fundos, na longa avenida

de acácias em sangue,
 

a buzina de uma ambulância.

(…)

 
-----



Por força do hábito, o sopro muda em zebras a roseira

de Guimarães Rosa. A caminho do baile onde, de fraque,

um aguaceiro noiva um martim-pescador, o vento

ataca os rebites de todos os navios no porto

e num enjoo claro, estagia de binóculo nas partes

do gafanhoto (dezasseis horas de cópula). Chegado à festa,

arma-se em redentor e derruba a mesa das bebidas,

liba as inescrutáveis trombetas da terra.

O vento, afogado na luz até ao pescoço, (…)

-----


 

Na lágrima da viúva via-se um velho cisne

que tossicava muito. Ela escamava à bancada,

enganchando a unha na guelra. Lembranças de miúdo,

ainda a alegria trotava no seu pequeno porte exangue.
 

A quem seguir quando «a cidade é um poço inumerável?»

(…)


------

(…)

Madagáscar, uma ilha com um trema no cu

e uma paz tão desopilada que vomita ogres.

A dúvida é se lhe tire a frio o pipo,

cisma Deus, ou se a quente lhe quebro os ossos



pela «incúria manifesta dos acontecimentos».

Mas, castigada a ilha, estancará o sangue

nas torneiras do continente? E finalmente a tsé-tsé



dará à luz a freira contra-alto que acorde na vergonha

«uma verdadeira especulação de bofetadas?»

Deus fecha-se em copas , encavalitado nos coqueiros.



-----

Um dia, num semáforo, bati

porque ruminava distraído num verso

da Primavera Autónoma das Estradas.

(…)

Um dia ofereceram-me um bonsai

que me lembrava o Mário à procura de

ventoinha nos armazéns do Grandela.
 

Um dia escrevi o Mário é imortal como todas

as Marias que calam o trilo de São

Francisco de Assis no corpo do seu soldado.

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FECHOS PARA SONETOS, COMPRADOS NA RETROSARiA

PiERRE DO COLOMBO

iii

Votre silence escreve a esferovite na vidraça

…………………………………………………..

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………………………………………………….

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……………………………………………….

………………………………………………..

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………………………………………………..

…………………………………………….

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………………………………………….

…………………………………………..

Um oxímoro por outro papo, tantos não!

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Ter um corpo e não lhe sentir

o cansaço: uma pretensão que avilta.

igual só a literatura armada

em piscina de condomínio privado.

 
O cristal cala o calafrio ou afia-o,

dúvidas de neófito à entrada

do Museu Gongora. Contudo, é

improvável morrer-se na fonte onde

 
se nasce. O "em-si" atrai muito pó,

já viste crica empoeirada?

Num sonho a sombra de Cristo

(…)

π

 

 

Rompeu o silêncio do exame

para indagar, Doutor, o alumínio brilha?

Em que porta estreita

Lhe terá Deus encoberto o espírito?

(…)

--------

 

Desta altura da minha vida – um sétimo andar

sem elevador – vejo a minha adolescência a pular

na mesa alemã e enxergo o modo doméstico

com que me fui estatelando ao comprido.

Vem isto de longe, em várias frentes e lugares

(…)

------

Uma luz caindo como cal

sobre os ombros em fuga

– porque só o ovo existe,

a galinha é o seu sonho –


conduz-me ao muro

dos teus olhos. (…)

-----

AUTO-RETRATO NO COMBOiO PARA RESSANO GARCiA

Que homem tão original, pensava a menina

que me enchia de macacos o cabelo,

mucos tenros extraídos das narinas

que a obstipavam (palavra tão bonita!). A mãe
 

não via, a mãe era um caso de cegueira e paciência,

o contrário da petiz que, para regozijo

dos poetas, compensava em ranho verde

a friagem do mundo. Ai o (cobrador!), corou

(…)

------

 
Sem dar azo a mais destrinças,

posta a alma ao lume

(bem ou mal passada?),

a treva encarvoa-se de silêncio.


Vem a alba e lembra-me:

tudo se penetra: (…)

------

(…)


Esgarça-se a nuvem, é uma questão

de sintaxe, sem esta

há lá emoção duradoura!,
 

nem seria a cerejeira reminiscência

nas costas da cama que te ouve

em blandícias.

-----

 
Procura-se leitor, morto ou vivo,

doze euros de recompensa,

alguém que restitua à letra

o corpo radiante, as mamas

en su sitio, o cuzinho refilão.

Procura-se leitor, morto ou vivo,

que vaze as minhas mãos

na sua espalhafatosa intimidade. (…)

-----


Não sei o que vos prometeram.

Este poema desapeou as bailarinas.

Chove, e não há outro prato na balança.

Todos os malditos dias, campeão.

É esse o nosso saldo – zero.

(…)

 
-----

Ir de cana, pintar o sete,

erguer em palafita sobre delgadas patas

de aranha o tabuleiro do medo

ou ir-lhe à rata abocanhar o queijo grié
 

– propósitos que esculpem uma vida

na sua jaula. Há quem prefira o comedimento

ser rato de biblioteca ou a convalescença

da ternura no passo da devastação,

 
a jaula é a mesma. O pão sonha

ser intratável farinha

ao vento. Deseja ter um prego

 
imaginário espetado na cabeça.

Que quando se olhe ao espelho

só se veja o prego.
 
 
A foto é do atelier do Bacon, um tanto parecido com o meu escritório e foi uma das imagens hipotéticas para a capa, hipótese que a editora (influenciada pela minha mulher, tenho a certeza)
rejeitou.

 
rejeitou

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

UM POEMA DE RADOVAN IVSIC E CINCO VARIAÇÕES

miró, que fez várias litografias para Radovan
 
 

OS PASSOS DA MORTE



Nos vagares de um vento lazarento

pelas mais densas florestas

betumadas as raízes numa mão imensa

que pulsa no coração da relva sombria

ao redor da pedra

no topo da surdez dos abismos

na noite anoitecida

pelas orações ensurdecedoras das conchas

no vento

no vento

a

a

v

e

desfolhou-se.



---------



Tudo em redor luzia nas mesmas trevas

Que levaram o teu coração

A achar um pássaro na gaiola.



Sonhemos então,

Nascidos de um riso nas lágrimas.



----



 

Ah, com as tréguas do tempo

posso eu bem,

quando pacifica e as mãos em concha

acomodam o bule.

Já não sei que lhe faça

quando tagarela como um insone.
 

Ah, viver como animais

e escrever como homens,

isso é que era, ver como

na avalanche da minha infância

a pedra do e rolou

e degenerou num a,

isso é que era.



Mas o apelo à eficácia, esse

entalhe dos desertos

que sósializa a vida,

não deixa

que se vulcanize a alegria.



E que eu faço eu ao tempo

que não se cala?



----



A secura daquele beijo

foi devorado até ao osso.



------



Baralhou todos os joelhos da sua vida.

ou foi por eles baralhado?

É quase um prodígio ficar tão à nora,

do lado de fora de joelhos

que como preciosos tentáculos o agarraram à vida

em álgidas noites de inverno.

Mas qual deles calou mais fundo em si,

escondido nos eflúvios?

O vento evade-lhe os nomes

e já os pormenores são trevas.



----



O vento folheou a ave

até ao fim

na sua primeira lição de geografia.

Depois ficou transparente

a tal ponto

que a ave voltou ao ovo.


 
 

terça-feira, 26 de novembro de 2013

BAGAGEM/LADRILHOS 1/ A HEMATOLOGIA

Cartier-bresson
 
 
Revejo-me absolutamente no excerto que escolhi de um artigo de Maria João Cantinho sobre um livro meu e por isso o escolhi para pôr na contracapa deste Bagagem Não Reclamada. Diz assim:
 
«António Cabrita construiu um percurso singular e avesso aos vários "ismos" que percorrem o panorama literário português. A sucessão imagética é surpreendente, vertiginosa, e entrecortada pela introdução do banal, o que acentua essa estranheza do território poético do autor, convocando frequentemente o leitor pela sua ironia e jogo lúdico constante com o real. Cito-o, onde ele afirma: ´O poeta quer levar em consideração todas as coisas, não mora num mundo particular mas dentro da totalidade do mundo humano’, o que leva em conta que a consciência do poeta é ‘a antena da raça’ de que falava Pound, comungando desse pano de fundo que é a sua época ou a história. Daí que a poesia, enquanto modo de exercício pleno da liberdade, seja também o medium da apresentação da dor cósmica ou da catástrofe.
Ao mesmo tempo, esta poesia revela os pólos de uma extraordinária força metamórfica da linguagem e convoca uma "melancolia expansiva", em busca de uma possível redenção, por vezes vislumbrada, sendo o poema nele o lugar onde o mundo (re)nasce, pelo sangue inaugural da linguagem.»
Obrigado Castor, dificilmente alguma vez alguém voltará a escrever alguma coisa mais apropriada para o pouco que faça e por isso aí vã três vénias e um saco de meio quilo de caju.
Entretanto,
Bagagem é um livro onde convergem vários afluentes, de superfícies e freáticos, e tem várias portas de entrada. Em breves pinceladas, exponhamos alguns tópicos.
Signos de vida, o sangue e os canais que o irrigam: as veias.
Num sobrevoo por alguns sonetos de Bagagem é fácil notar que, como se guinadas fossem, em vários poemas as veias e o sangue se figuram como o contrapeso da morte:

(…)
Perder o Paraíso é como o outro,
perder uma veia num dedal
de chumbo e cinzas pia
mais fino. (…)
Ψ
 
 
Voz de um osso antigo
mas de um sangue síncrono
todo ele empenho e susto:
há que dar os primeiros passos
no vazio, o pleno vem atrás.
E é inútil dizer que não: Deus
soprou-me o sangue pela casa.
Ψ
 
 
(…) porque certo é:
veia que se deite logo arrefece
se outro coração não lhe deita a mão.
Ψ
 
 
Secreto condomínio: o de cada veia
no seu galho. E grave: com um nome
morto que assobia dentro em ti.
Ψ
 
 
Saberá que no labirinto da pele
Uma veia dá a volta ao mundo?
Ψ
 
 
Somos plantas que perderam a raiz –
o vislumbre de achá-las
é o que faz correr o sangue.
Ψ
 
 
Crendo embora que a vida
seja a morte por dom, exilei-me
e pelo resgate do sangue na bainha
de alguns versos respiro.

 
Embora às vezes seja necessário olhar a dor e a morte de frente, como nos dois sonetos do ciclo SEDA & FRUTOS, escrito quando a minha mãe morria de cancro, e que como pede o contacto com essas tangências mais informuláveis são poemas mais elípticos e antidiscursivos:
V
Atroz, a trepadeira
da dor. Escava
na fronte,
desinforma as precauções.

Atroz, como o bico
da narceja que imprime
na carne da ameixa
certificado de qualidade.
 
Tudo se emula
quando a Seda
assenta o seu rosto
 
no látego, tique-
-taque em deslaçado
voo, centrípeto.

 
VII
É assim que vejo a chamada
da morte: uma Seda
alumia num átimo
as claraboias interiores.

Ventilada por baixo
em plena prol, a ameixeira-
-brava descobre-se propensa,
e não amêijoa.
 
Menos um percalço
que um perdão:
olhar projectado
 
numa extensão que
laqueia a dor. Selo
lambido por um cego.
 
 

DA BAGAGEM AO LIBELO A FAVOR DO CURANDEIRISMO

 


1


Está pronto o meu livro de sonetos Bagagem não Reclamada, Alcance Editores.Vou à tarde buscar os exemplares a que tenho direito. É um livro singular que nas redutoras actuais condições em que se processam as edições no mundo de língua portuguesa dificilmente teria lugar noutro lado. Só a circunstância de à partida os livros terem um mercado exíguo em Moçambique, obedecendo portanto as motivações para os fazer a outros critérios, é que autoriza que um livro como este se faça. Neste momento eu não teria coragem de propor a mais nenhuma editora – em Portugal ou no Brasil – este livro e aliás por isso me resolvi a fazê-lo. E foi um gesto de grande coragem da editora levar a coisa até ao fim. Noutro espaço seria incerto. Aí está como os exemplos de liberdade surgem por vezes donde seria implausível esperá-los.


O género, o soneto, apesar do seu cunho histórico – ou precisamente por isso – levanta imediatas suspeitas. Tornou-se tabu e consente-se a poucos, excepcionalmente, praticá-lo. Até porque é de facto difícil, e poucos não deslizam no desafio. O livro foi-me sendo pingado ao longo de trinta anos. Nunca projectei na cabeça fazer um soneto quando lanço o primeiro verso – é-me simplesmente um ritmo que às vezes me é favorável. Bastou-me aceitar a coisa.

São 180 sonetos – o mais das vezes rudes, fanhosos, densos, barrocos. E é literatura sobre literatura, em torno das palavras e no torno da memória da escrita. Um livro que cairá em Moçambique como um objecto estranhíssimo, gongórico, e que só teria filiação nos sonetos de João Pedro Grabato Dias, que já ninguém lê há mais de vinte anos. Serei com certeza acusado de hermético. Mas o hermetismo sempre atrai os jovens e se por essa via influenciar alguns jovens a sair da linha saturada da poesia social terei feito algum serviço.

Nada tenho contra a poesia social, apenas contra a muita má poesia social que o mais das vezes se pratica em nome das inércias políticas e da preguiça, bem como contra "o dirigismo" das vias dominantes. Aprender que um verso pode surgir apenas por se amar as palavras e a conversa subtil que as palavras organizam entre si pode ser o mais salutar dos antídotos. Mesmo que seja no rasto de uma irradiação que não nos deixa ver claro e levanta mais perguntas que respostas. A poesia tem tudo a ganhar com as perguntas.

Contudo, tenho consciência que há neste momento poucos leitores para o meu livro em Moçambique e que ele me trará mais inimigos e recriminações veladas, uma por outra chacota. A tudo encolho os ombros. A vantagem dos sonetos é que dá umas enormes margens brancas na página onde tais criaturas poderão fazer jorrar as suas imprecações e reptos e contra mim escrever as suas obras-primas.

Não faço ideia de como será recebido em Portugal, embora o unânime sucesso crítico de A Maldição de Ondina me tenha posto na mira. E aí o nível médio dos leitores, sobretudo de poesia, é mais alto, pelo que o livro, para lá, não traz, como não pretende, novidades.

Pessoalmente, para o bem e o mal, acho que o livro é um marco na minha obra.

Ficam agora por editar três inéditos de poesia, bastante diferentes deste após o que posso finalmente pôr-me em acordo comigo e abandonar esta arte. Aliás por boas razões: lendo os poemas luminosos que o Paulo José Miranda anda a publicar no facebook, e apenas no facebook – renunciou a publicar poesia em livro -, compreendo que o mundo não precisa de mais ruído, e para já, não tenho mais nada a dizer em verso.

O que, ao contrário do que pensaria, há uma década atrás, não me desgosta nada, só me encanta. Estou de novo numa fase em que necessito de me libertar da poesia para um dia, se acontecer, voltar a ela, mais livre e irmanado com os elementos.



2


Estou um pouco desapontado com o livro que a Paulina Chiziane co-escreveu com o curandeiro Rasta Pita, Por Quem Vibram os Tambores do Além? (Índico Editores)

Todos os livros que quebrem com a tirania do positivismo e os preconceitos do racionalismo são bem-vindos. O problema é que este tipo de "abertura" exige mais rigor e, até para se sustentar uma autoridade identitária, um maior afã comparativo. O livro limita-se a seguir a trajectória de vida do curandeiro até este se tornar um xamã. Infância, sonhos premonitórios, provações, e iniciação na medicina tradicional; ao que se segue a apresentação de alguns tópicos da "morfologia conceptual" do pensamento mágico: as árvores, os espíritos, os fantasmas, os animais e os espíritos, os espíritos das águas, etc.

Nada que qualquer bom tratado sobre as religiões tradicionais do mundo não traga.

A necessidade de por causa da febre do Afrocentismo se apresentar as práticas e crenças tradicionais africanas como originais, e únicas, quando muitos dos seus fundamentos e elementos são verificáveis em muitas culturas e lugares enfraquece a pretensão do livro pois o seu pendor descritivo e crédulo acaba por não firmar a legitimidade que se pretendia.

Por exemplo, o que na página 31 se lê como referente à relação do africano com a natureza é afinal análogo à ideia de Ressonância que acomoda a Natureza no Taoísmo. Ou quando se lê que o curandeiro se presta para leitura dos três olhos do coco: «Lançam-se as pedras ou conchas e pergunta-se: o que diz o teu olho sobre a tua vida? O que diz o olho do mundo? Ou o que diz o olho de Deus» detecta-se imediatamente que a lógica que ele segue é semelhante à do isomorfismo que está por trás dos jogos de adivinhação do I Ching.

Ou seja, uma leitura comparada deste saber africano com os saberes de outras tradições acabaria por reforçar a sua pertinência e ser mais útil à afirmação da sua validade que a máscara de uma pretensão identitária que só parte do desconhecimento e por isso exige a crença (um instrumento menos fidedigno do que a evidência) para que se aceite cruzar o umbral entre a realidade e a ilusão.

Outro flagrante caso de falta de rigor é o que apresenta a suposta cura de Dismas, o irmão de Rasta, na infância destes. Um dia Dismas acordou e não conseguia mexer as pernas. E explica ele: «Quando estive a dormir, vi em sonhos uma mulher que veio só para me pegar as pernas e depois desapareceu» (pág.44).

O que é facto é se passaram anos sem que Dismas se conseguisse locomover – e nem as idas à igreja cristã ou ao médico trouxeram qualquer restabelecimento ao irmão do curandeiro. Este entretanto ia tendo sonhos que lhe anunciavam que a cura daquele se daria através da medicina tradicional e com um determinado curandeiro, mas a mãe não lhe ligava. Só ao fim de anos de impotência e de combate frustrado contra a doença é que a mãe resolveu seguir os conselhos dos sonhos de Rasta. Lá localizaram o curandeiro, num lugar distante de casa, e então os dois rapazes ficaram com o terapeuta vários meses até à melhoria de Dismas. Voltam então casa e podem então voltar à escola.

E na página 54 lê-se: «Ele (Dismas) era bom de briga, apesar da deficiência. Ele atacava e se defendia como ninguém. Gatinhando, surpreendia o adversário, agarrava-o pelas pernas. Bastava conseguir derrubá-lo esmurrava-o até não poder mais».

Apesar da particular incidência dos sonhos premonitórios de Rasta, que lhe definiram a vocação futura, apesar dos especiais atributos do curandeiro Sindano, a melhoria de Dismas não se mostra brilhante. Tudo isto ilustra cabalmente uma manifestação de crença sem provar um efectivo resultado terapêutico, e creio que os "poderes" de Rasta Pita lhe terão de ter chegado por via de outros sonhos mais poderosos e de ensinamentos mais eficazes.

Tal como estão na narrativa a coisa não é crível, ou só para quem à partida já seja crente.

Igualmente, não sabemos que dizer quando, ignorando o papel do inconsciente que um século de psicanálise mapeou, se toma por um espírito o alter-ego que se figura no sonho, dando por mágico o que seja o simples trabalho da "mecânica dos sonhos" (pág. 199, o exemplo do mecânico de automóveis), sem que um olhar crítico separe naquilo que Rasta conta o trigo do joio.

Estes involuntários "actos de idiolatria" não servem os propósitos do livro e com eles Paulina não protege o seu amigo aproximando-o sem querer, e em alguns momentos, da charlatanice, o que é pena e o livro não merecia pois, apesar deste ser um livro ingénuo (no sentido em que nunca se auto-interroga e não num sentido depreciativo) é claramente honesto, como honestos são os seus protagonistas.

Enfim, um livro cheio de boas intenções, que nos elucida sobre uma certa "poética" de relacionamento com o mundo e cumpre ao nível duma primeira divulgação imediata mas que, a níveis mais analíticos, é uma oportunidade algo malograda para falar seriamente de saberes transpessoais.

O que era vital.

(Parabéns ao bom trabalho gráfico do Lénio Ussivane)


quarta-feira, 20 de novembro de 2013

UM PHOTOMATON E UMA CANÇÃO DESENCRAVADOS

 
 
 
estes vão p’ró moço Henrique Fialho, que faz anos,
a quem admiro e que felizmente é casmurro


1. BECKETT


E num relance é-me evidente: a estreita cabeça
do Beckett é uma armação totalmente vegetal, 
e no pergaminho do seu rosto  
escondem-se um repolho e duas folhas.


Sim, as que emergem dum pescoço filiforme
que quis chegar às estrelas mas se resignou
em pecíolo e em cuja metade pulsa, inútil,
aquela vagem do tamanho dum amendoim.

 
Num relance, isento de estigmas, é-me evidente
que a leitura da sua acostumada imagem,
entre ave de rapina e angústia,
lhe vem da extrema lentidão,


uma lentidão de estuque ainda fresco,
da lenta fruição da clorofila
que o autor partilha com as suas personagens
e até no modo recalcitrante como lutam & lutam

 
consigo mesmas, pelo vão ensejo de parecerem
mais activas que contemplativas.
Fito-lhe o retrato imaginando que plantas
hão de ser tão emaranhadas. Como se ele em criança


tivesse queimado o rosto com uma máscara
de funcho. Peço um Grants, duplo,
pois quero vê-lo espelhado nos estalidos
do gelo, e então ouço-o

segredar-me, num irlandês
de duas gemas de ovo:
"Creio que inventámos o amor
para que Deus não se suicide!"


retrato de Lou Reed por Alice W R
 

2. LOU REED



Vendia botões de madrepérola em Brooklin
o janota que tinha um deus
que vivia em três mundos.
Mas assim que montava o selim
de freguesa auspiciosa,
com fundos e amante de folhetim,
punha um ar de bezerro
em ultra-levure
e trauteava-lhes, a boca
em fotogravura,
tu tu tu, satellite of love
tu tu tu, satellite of love.


Não era o único truque do sabido
também lhes recomendava book
sobre a pintura dos bambus,
que num ressoante vagido
largavam ao vento o nome das viúvas
ou das solteiras mais injustiçadas
aquelas que catrapus
fariam cair de novo o império romano,
e depois: tu tu tu tu, satellite of love
Tu tu tu tu, satellite of love.

 
Passou duas noites na esquadra
por assédio, onde defendeu
que não passava dum budista primitivo
e talvez dos médios, dos menos atractivos.
Mas houve uma Fátima que lhe pegou
- eu dou-te o meu lençol e tu dás-me o coração –
que bom cair nas trampas da ilusão;
há-de no rastilho tornar-se mártir do Islão?
tu tu tu, satellite of love
tu tu tu, satellite of love
tu tu tu, sa-te-lli-te-of-lo-ve

 


terça-feira, 19 de novembro de 2013

DA RESPONSABILIDADE DE NOTICIAR

 

Recebi hoje de manhã, por mail, a carta, que transcrevo em baixo, do escritor e antropólogo José Pimentel Teixeira e que ele endereça à direcção do semanário Expresso, a propósito da notícia que nela se discute.
Manifesto aqui a minha igual dúvida sobre a oportunidade e a pertinência da notícia, dado o actual contexto político-social que é vivido pelos emigrantes residentes em Moçambique (ou também em Angola).
Tudo o que sublinhei na carta de Pimentel Teixeira é exacto - e ele, nos últimos meses, tem sido dos primeiros a desdramatizar em vários postais, no seu Ma-schamba, o ambiente que se vive, sobretudo em Maputo, deitando água na fervura de algumas reportagens mais sensacionalistas que em Portugal têm saído sobre Moçambique. Contudo, esta "pérola" era desnecessária, ou reflecte um sentido de responsabilidade algo ambíguo.
Tanto destaque dado a revelações tão pífias! Há algum desajuste entre a necessidade de resguardar o direito de informar a todo o transe e o efeito pernicioso que uma coisa "tão pouca" causa sobre os portugueses que cá vivem.
Mas leia-se a carta do José Pimentel Teixeira:  

«Para: Director do jornal Expresso

Acabo de ler a notícia publicada pelo Expresso sobre a colaboração dos serviços de informação portugueses e os seus homólogos americanos, bem como a comunicação da direcção do jornal subscrevendo essa notícia e reafirmando o seu conteúdo.

Não é preciso ser um grande leitor de Le Carré para acreditar nisto. Não é preciso ser muito atento para comentar essa vossa notícia com um "isso é notícia?", no sentido de questionar a sua novidade, a sua urgente actualidade.

Sou português e vivo há 17 anos em Moçambique. Para além dos problemas económicos e sociais que o país vive nunca, como desde meados de 1990s, quando o conheci, se assistiu a uma situação tão tensa, política, militar e criminalmente. E nunca como agora se assistiu a uma campanha pública, mediática, com utilização de argumentações racialistas e racistas tão exarcebadas. Para além disso recuperou-se a utilização de algum anátema sobre os portugueses residentes. Tudo isto é público, e com toda a certeza do conhecimento do pessoal de um jornal com a dimensão do Expresso.

 
A notícia em causa, do seu jornal, li-a ecoada por moçambicanos. Provocando imediatos, evidentes, e até compreensíveis, ditirambos contra nós.

Os critérios sobre o que é notícia, o que é relevante, o que é novidade, o que é urgente, o que é inultrapassável, são seus, e da equipa que dirige.

E com toda a certeza lhe serão indiferentes os efeitos explícitos e implícitos de uma notícia destas, aparentemente sonante mas que é apenas uma coisa morna que serve para a resmunguice interna. Efeitos sobre os seus compatriotas que, sem terem nada a ver com isso, estão a cruzar este momento aqui. E que vivem num contexto em que essa "morna" caixa que aí arranjaram, e V. coordenou, tem ou poderá ter outra temperatura e efeitos bem mais duradouros.

Isto diz muito mais sobre si, director do Expresso, e sobre o seu colectivo, do que sobre as trocas de informação entre serviços de informação de países aliados. Diz, evidentemente, muito mal.

Em termos nacionais, algo que ainda é de prezar, o que V. mandou ou permitiu fazer é uma malevolência.

E, creio, num país distraído como o nosso ninguém lho dirá. Até lhe aplaudirão a pertinência.

 

É esse o (nosso) mal.»

Creio que da parte do Expresso e da sua direcção houve apenas alguma incúria causada pelo desconhecimento do território. O problema é que estes deslizes se repetem na comunicação social portuguesa, que não entendeu ainda as particularidades de se lidar com uma ex-colónia.
Para se entender melhor o dano e a que ponto as coisas estão quentes coligi alguns comentários à notícia escritos no site do diário O País, de Maputo, só de ontem para hoje, e teremos de ter em conta que estes comentários são produzidos pela élite urbana de Moçambique, por aqueles que têm acesso à net, sendo na sua maior parte gente de nível médio/universitário:

Top of Form 1

Bottom of Form 1

Ricky Momad · Comentador principal · Software Engineer na empresa Critical Software

Essa é uma situação extremamente complicada o nosso ministro dos Negócios estrangeiros no quadro das suas competências devia convocar o Emabixador de Portugal a explicar-se sobre o assunto, mas a mim essa informação não me expanta nem tão pouco, só espero que algumas pessoas percebam que estamos num mundo glabalizado e todos querem tirar ganhos de todos, sinto pena de Portugal estar a colaborar nessa espionagem numa altura destas em que precisa de África pra sobreviver e particularmente de Moçambique e Angola como grandes parceiros de Negócios, África tbm deve aprender de uma vez por todas que deve se unir pra sobreviver neste Globo.

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antoniodacosta.oliveira (com sessão iniciada através de yahoo)

PORTUGUESES, PARASITAS DE MERDA, FILHOS DA PUTA. QUE DEIXEM EM PAZ A AFRICA, RESOLVEM OS PROBLEMAS DO VOSSO RECTANGULO MISERAVEL, QUE AFUNDOU-SE NO MAR DE MERDA.

Paulo Ricardo Pereira Tina · Comentador principal · Progress College

e ironico neste momento tarmos aqui a chamar de "brancos exploradores" no entando usamos o facebook mesmo para comentar neste jornal, facebook que ta sempre a partilhar informacao com a nsa, facebook um site 110% americano, aonde todas nossas fotos informacoes e chats, sao automaticamente guardados nos servidores do NSA e CIA..... por isso pessoal.... nao podemos virar as costas para realidade do mundo....tamos na era da Globalizacao aonde todo mundo usa e ajuda aproveita explora..... todo mundo...


Seus vermes, mortos de fome, portugueses de carralho de merda, pensam o que? Mocambique e nosso e independente! Podem fornecer todo tipo de informacao que voces quiserem e a quem quiserem, aqui ja nao tem nenhuma chance de recolonizar. Que se lixem com a vossa pobreza e nos deixem em paz seus fantoches!


 


Filhos da Pu**** desses tugas e de todo esse bando de exploradores. . .se eu fosse o PR cortava as relações com esses culh***** e lhes mandava passear.

 


Olhando para esta situação, Robert Mugabe fez bem em mandar embora os Ingleses, suspender vistos dos portugueses é um pouco de exagero, mas temos que rever as relações diplomaticas com estes Portugueses falidos. Unico investimento valioso que portugal tinha era HCB, se Angola deixar de investir em Portugal, vão para banca rota. Mal criados!!

 


ABUSO DE CONFIANÇA E DE PREPOTÊNCIA DE PORTUGAL. MOÇAMBIQUE TEM QUE ACCIONAR MECANISMOS PARA PEDIR ESCLARECIMENTOS. MOÇAMBIQUE JÁ NÃO VOSSA COLÓNIA, MAS PAIS SOBERANO. SEUS ABUSADOS.


 


estes tugas do raio , estao a dar uma de grandes investigadores , pobres do raio , nao vao entrar mais em moçambique e os que ca estao terao vida negra ate voltarem a terras lusa , macacos .


 


E QUANDO VOS DAO ALGUNS DOLLARS DIZEM: "OS NOSSOS AMIGOS PORTUGUESE". O AMIGO DO AFRICA FOI E SEMPRE SERA O AFRICANO, E TODOS OS BRANCOS, NAO INTERESSA DE QUE PAIS SAO IGUAIS, UNIDOS E SEMPRE JUNTOS LUTAM CONTRA O DESENVOLVIMENTO DE AFRICA ABERTA E CLANDESTINAMENTE. O QUE FUNCIONA AQUI, OS AFRICANOS PRECISAM PERCEBER QUE E A COR DA PELE E NAO A AMIZADE. OS BRANCOS TODOS SAO EXPLORADORES DOS AFRICANOS. ACORDEM POVO!!!!

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Jossias, o complexo e' deixar passar. quem nos explora sao os brancos. nao leste qual e' a receita do governo nos recursos naturais? a FMI, BM, e' k deixam nos nesse estado onde estamos. o governo e' culpado pk aceita assinar esses contratos desvantasojos mas sabes k os lideres africanos k nao se identificam com o neocolonialismo e exploracao sao julgados no TPI . abra a vista, o problema nao sao os lideres ou o governo mas sim o sistema. esta ai Zimbabwe e Africa do sul para perceber o k esta acontecendo Mugabe era o lider icone para os europeus mas quando decidiu levar a terra das maos dos brancos que reprentam a minoria deixaram o pais numa crise de tirar lagrimas. EUA e Europa dizem k se A Africa nao aceita homossexualismo vao cortar as doacoes. nao ves k nao temos nenhum poder mesmo?


 


Cuidado... Nós, temos a dor dos nossos avos. Independentes africanos nao expulsaram esses pra darem mais oportunidades. Respeitem no vosso hino


Ontem às 6:33 através de telemóvel · Gosto · 2

 

Ontem às 7:40 através de telemóvel · Gosto ·

 

1HYPERLINK "https://www.facebook.com/raimundosilvestre.bucuane"Raimundo Silvestre Bucuane Espero k a relacao luso-mocambique termine mais rapido possivel pk isso é uma traicao

há 13 horas através de telemóvel · Gosto · 1

Eu como estou entretido a passar para mp3 tudo o que encontro de Takemitsu e de George Crumb no Youtube, e pouco saio de casa, creio que estarei mais a salvo da agressividade que os meus compatriotas operários sofrerão na pele, entre bocas e feios soslaios. Esperemos que a coisa não degenere nuns calduços - que a violência anda à flor de todas as oportunidades.
E preocupo-me com  tranquilidade das minhas filhas que todos os dias têm de atravessar a cidade para ir e vir da escola.
Moçambique, para quem ainda não percebeu, não é só praias e palmeiras. Tem também a rudeza da foto que pus em cima, e a sua paisagem humana é sensível aos conflitos latentes que, por estes dias, estão ao rubro. 
Escusamos é de pôr lá lenha.