terça-feira, 14 de agosto de 2012

PROUST, UM DIZER

 
«Quando Proust descreve o seu empreendimento literário como correspondente a “uma busca da Verdade”, ele não aspira evidentemente a uma verdade simplesmente subjectiva e acidental (…) Não se trata, no seu espírito, de um simples modo de falar», diz-nos Jacques Bouveresse em La Connaissance de L´Écrivain (pág. 16).
À primeira impressão, hoje, tende-se a desvalorizar de imediato a pretensão de um objectivo assim tão desmedido e, dir-se-ia até, tão artificial.
Mas outra evidência aflora então por detrás desta onda relativista: é que os “cépticos”, na verdade, não escreveram a obra de Proust, nem têm, na sua esmagadora maioria o seu fôlego, o seu ritmo, a sua capacidade de introspecção e a sua imensa mão para a arquitectura.
Desdenham porque não podem se igualar.
Eu nunca consegui ler de seguida mais de um dos tomos do La Recherce… por limite meu, porque fico embuchado e uma vertigem me atravessa. Mas não me atrevo a duvidar que cada homem ergue o desafio que é capaz de travar.
No caso dele era infinito.
Daí a reserva que mantenho sobre a seguinte asserção proustiana: «Tout ce qui peut, dit-il, aider à découvrir des lois, à projecter de la lumière sur l’inconnu, à faire connaitre plus profondément la vie, est également valable.» (também citado por Bouveresse, idem), que suponho ser a fala de uma personagem, pois Proust com toda a certeza intuiu que os mistérios se multiplicam à medida que nós multiplicamos as sondas – como se verificou no século XX, quando, paralelamente ao homem ter inventado novos aparelhos de medida, se foi ampliando o mundo e os seus horizontes, no micro e no macrocosmos. E o que vale para o exterior a nós, vale para os abismos abissais da introspecção.
Ou seja, acredito, e não é apenas um modo de falar, que a Verdade a que Proust ousou querer chegar tem um perímetro diferente da verdadinha que almejo vislumbrar mas isso não me desmoraliza porque, ao invés de achar que vivemos rodeados de simulacros, creio ser verdadeira a experiência de Proust e a sua dimensão topológica, pelo que o seu exemplo não me faz embater em alguma aporia mas antes me galvaniza.

Sem comentários:

Enviar um comentário