para o Jorge, o Corvo
Ah, ser um poeta didáctico,
desses que metem a botânica
em verso,
ou ser um deus
capaz de morrer
com o hálito mais puro.
Um deus de imenso pedigree,
ou já não sei se deus
se o seu luto.
Mas não este calhordas,
este inábil alfaiate
que com a boca prenhe
de alfinetes se esqueceu
de matar as cócegas
à viscondessa.
Tão pobre que fiquei
perdulário e incapaz
de desembainhar
por diante
a lâmina do pensamento.
Saciam-me as orlas
delas faço bainha.
Jamais há dias,
apenas
noites albinas.
O tempo é uma estela
de maravilhas e desastres
diz o outro. Um deles
que eu já não possa
arrancar os olhos
àquela de onde nunca
devia ter saído.
O senhor que se vê de costas
nestes versos não é feliz
foi sete vezes à Ciocciara
mas não é feliz
e no rosto escarificações
e tatuagens não lhe trazem
qualquer consolo
à sensação de que o futuro
é um número
de conta
bancária.
Revejo na alma a casca
do caracol,
a baba do daimon,
e maldigo-me,
preferia
ter nascido girassol
de um escol
que segue o astro,
ao menos no fragmento
450 digo como é:
professo
a metempsicose,
ah ter sido
o mosquito rebentado na palma
da mão que no acto
seguinte lavrou de vencida
a ode marítima
dá-me alento
é a única coisa
que me leva a levantar
e a comprar um garrafa de gim
e a carregá-la no bolso
na mira dos goles
com que entreolharei
os coices
que receberei
nas apostas de cavalos.
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