segunda-feira, 1 de agosto de 2011

TABUINHAS DE OSSOS, ROXAS


Fico sempre espantado com a facilidade com que os líricos gotejam. A mim calha-me pouco, os versos de amor; sobretudo os que não considero vulgares. Hoje calharam-me estes, não sei se os estimo, mas pelo menos talvez mereçam o perdão. Já não é mau.


1
Tabuinhas de ossos
e remoinhos profundos
que fazem cair
a carne nas frinchas.

O caos já foi uma região
com mapa
quando fui assobiado
pelo teu nome.

2
Palavras que conversam entre si
como as nuvens e os rios:
o fogo preso
com que me laçaste.

3
Ah, ter sido um polidor
de lanças na Atenas de Péricles
não me favoreceria nada
pelo menos tanto como este jeito
descuidado, algo banana,
que temos de amar
no outro a ferida
 que o preserva.

4
Apesar de nem todos
os teus átomos
serem a meu favor
algo no teu sorriso
aglomera as constelações.

5
Entre nós não se diz

“pode baixar o volume
do seu televisor?”.

Pólen e Mozart.

6
Devíamos merecer o amor
e não agir como detritos
que no indiviso susto
vivido a dois
tentam lavar
as palavras venatórias
com que se entregam à melancolia.

E se deus houver nesses espinhos
é o sangue que aí devemos pendurar,
pois não são inexauríveis
as fontes?

7
Há-de
quando muito
o vento distrair-nos,
não o Hades.

O vento
que a tudo instrui.

8
Uma luz caindo como cal
sobre os ombros em fuga

- porque só o ovo existe,
a galinha
é o seu sonho –

conduz-me ao muro
dos teus olhos.

9
Como dar à luz
o deus das tempestades,
tudo o que me inclina para ti.

10
A miúda do Texas Jack
chamava-se Raio de Luar.

Fui o seu segundo casamento,
a segunda vinha
que brotou na sua sombra.

11
Tabuinhas de osso,
como em Bacon
a crucificação.

mas imemoriais
no entusiasmo

e troco de bandeja
três musas pelo teu espanto
em descobrires tulipas
roxas em Maputo.

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