Tive o prazer de reler As Viagens de Gulliver, nestes últimos dias. Fiz um contrato com uma agência de notícias em Lillipute para me trazerem informado. Eis o primeiro boletim de notícias:
1
Não é segredo para ninguém que fui polinizado num dos passeios dominicais dos meus pais à cabeleira de Gulliver, o jardim mais popular de Lillipute, nesse verão de todos os bons agouros.
Não fui o único, podíamos criar uma filarmônica.
A maçada, contam os meus pais, era conseguir iludir os mirones e os miúdos, que iam para lá reinar às escondidas, mas se acocoravam ao trinar do primeiro gemido, armando a fisga. O pior de todos era um reguila chamado Vasco Pulido Valente. esse queria com um so olho acertar nos dois escrotos.
nunca mais foi visto, parece que fugiu com uma companhia de teatro.
nunca mais foi visto, parece que fugiu com uma companhia de teatro.
2
Eu parto os ovos pela extremidade maior, mas não caio na desfaçatez de mofar de quem os parte pela extremidade mais pequena,
posto estar ciente de que a gema fica sempre a meio, eqüidistante de facções.
E quando nela molho o pão, adivinho como o povo se ressentiria, se pendêssemos por um só dos lados e a gema se desintercalasse de perfil.
Deve ser por isso que às vezes me acusam de ter caído da lua.
3
A dama de companhia que por descuido – adormeceu a ler um romance – tombou a vela, causou o incêndio nos aposentos de Sua Majestade.
Como a ação do romance se situava em África, na região dos Grande Lagos, fica manifesto não apenas os malefícios da leitura como as metástases da mentira que toda a literatura atiça.
Aliás o que se depreende deste excerto que citamos: “tive a oportunidade de ver um cozinheiro a depenar uma cotovia que não era maior que uma mosca comum”. É uma questão de verossimilhança, o análogo não traz riquezas, só fantasmas e atraso.
Ainda se o romance nos confiasse como nas faldas nevadas do Kilimanjaro se depenam gorilas, ainda vá que não vá...
O romance, confessou a senhora, foi-lhe dado por um viajante português que dá pela graça de Paulo Portas, ninguém o conhece e teme-se que deixe a senhora a penar sozinha pelo seu crime.
4 Fala de Gulliver
Confidencio-vos que apesar de Sua Majestade me ter feito prometer pela minha honra que não levaria comigo nenhum dos seus súbditos, ainda que eles permitissem e o desejassem, me veio imediatamente à lembrança o artifício de Papillon, e tudo fiz para transportar comigo acomodado no meu orifício menos lustroso o mais curioso dos seus concidadãos - com um coelho branco que quis levar por companhia.
Foi manobra de que me arrependi toda a vida, pois o afortunado nunca descoou o ressentimento e após muitas digressões com um circo austríaco casou com uma anã cuspidora de fogo, dando lugar a uma linhagem que espalharia o fedor pela paisagem e assolaria a Europa de atrozes salvadores das pátrias que, por vingança, cravejam as almas dos seus súbditos na fogueira dos impostos, só os libertando sob promessa de lamberem de trás para a frente os rastos castanhos e nauseabundos dos passos do coelho.
5
“Mantenha sempre as suas sílabas acima
De qualquer clima – em vez de próteses, pontes,
Ou dentes de ouro, faça como o Lima
Implante uma ovelha de Lillipute.”
Anuncia a Clínica O Dente Alvo do Político
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