domingo, 27 de novembro de 2011

AS CÉLULAS DE AUDEN

auden (1907-1973)

Alguns canteiros colhidos em Marginalia, Shorts e Shorts II, e traduzidos para serem dedicados a Jorge Listopad que fez 90 anos.


Destrói o destino
um ror de espécies: uma só
se compromete a si mesmo.


Poucos conseguem lembrar-se
claramente quando a inocência
tomou subitamente fim,
do momento em que cada um perguntou
pela primeira vez: Fui eu amado?


O amor Verdadeiro
tem vinte por vinte de visão
mas fala como um míope,


Ao homem morto
que nunca fez morrer outros homens
raramente lhe é atribuída uma estátua.


A divisa do tirano:
Tudo o que É Possível
É Necessário!


Os fémures de animais
atribuídos a santos que nunca
existiram, são ainda

mais sagrados que os retratos
de conquistadores que,
infelizmente, existiram.


Os americanos – são como as omoletes:
não há nada de melhor
quando é conseguido.


Ao escutar os Estudos
de Chopin, extasiado
por esse casamento de amor entre Técnica
e a Expressão, ele esquece
que o seu Amor não estava lá.


A esperança de um poeta: ser
como um queijo da serra,
local, mas apreciado algures.


Quem pode imaginar
Calvin, Pascal e Nietzsche
em pimpolhos rosados e rechonchudos?


Privado duma mãe que o ame
Descartes separa
o Espírito da Matéria.


Era o espaço sagrado para
os peregrinos de antigamente, até que o avião
atalhou todas essas enormidades.


Os rios, tarde ou cedo,
atingem todos algum oceano,
e na estação própria também os homens
chegam a um leito de morte, mas
nenhum deles o fez de propósito.


As nossas mesas, as nossas poltronas e canapés
sabem coisas sobre nós
que os nossos amantes ignoram.


O que nós tocamos é sempre
um Outro: eu posso acariciar
a minha perna, não o Eu.


Só a má retórica
pode melhorar o mundo:
ao discurso Verdadeiro, ele está mouco.


Não passamos, todos,
de bugigangas cósmicas, mas nenhum de nós
é inessencial.


Nenhum de nós está tão novo
como dantes. E então?
A amizade não tem idade.


Entre os mamíferos
só o Homem tem orelhas
que não exprimem nenhuma emoção.


Qualquer que seja a sua fé pessoal
todos os poetas, como tal,
são politeístas.


Onde quer que exista uma forte
desigualdade, os Pobres
corrompem os Ricos.

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