E mais não é preciso
dizer:
Aprendi, nesse inverno,
o livro, mais do que o desenho,
protege o nosso sonho.
Aquilo que
distingue a palavra ave da palavra pássaro.
E isto me basta.
Na ave pressinto os universais, na palavra pássaro diviso os singulares: e deste trânsito, do abstracto para o particular, se perfaz esta poesia tão repleta de hiatos, lapsos, elipses e pormenores. Por isso a sua densidade neo-platónica é perfurada pelo quotidiano, pela contingência.
Na primeira citação
encontro algo que me agrada imensamente em João Miguel e que torna o seu lugar
um poiso onde sereno sempre: o poeta nunca se esquece da extrema
vulnerabilidade da vida e das paixões humanas, ao ponto de reservar para a
leitura esse único porto seguro onde se protegem os sonhos. A escolha do verbo aqui
é importantíssima: trata-se de os proteger, não de expor, desbaratar, vulgarizar
os sonhos. Essa é a triste escolha dos políticos e da arte de massas. A poesia
reserva-se ao direito de não gastar o raro, protegendo-o da usura comum. Por
isso será sempre ambivalente, mais visando a concretude das imagens que o
realismo (há uma estúpida confusão em torno disto), um modo de deslocalizar a
ordem no múltiplo:
Encarregado de velar o trabalho dos mortosestava entre as crianças perdido
de aventura e ciúmes.
Por isso será sempre ambivalente, mais visando a concretude das imagens que o realismo...
ResponderEliminarPerfeito isso!
Seguindo vc... na intenção de aprimorar minha sensibilidade...