MIROSLAV HOLUB (1923-1998), foi um brilhante poeta checo e um imunologista de renome mundial. Dizia o Ted Hughes que ele seria um dos da meia-dúzia de poetas mais importantes a escreverem em qualquer parte do mundo - nesse momento em que o Hughes se lhe referiu – e, apesar do exagero que estas coisas têm sempre, se o viúvo da Sylvia Plath o disse, para mim é dogma. Estas cinco versões resultaram do cotejamento das traduções francesas e inglesas.
1755
Neste ano, começou Diderot a empreitada
da Enciclopédia e em Londres foi aberto
o primeiro asilo para loucos. Assim se começou
a preceder à contagem dos sensatos, que se cobrem
de nomes, e dos insensatos, que depenam
incansavelmente o próprio corpo.
Os poetas devem aprender a arte dos funâmbulos.
E, para que não hajam dúvidas, palhaços sisudos
debitam instruções sobre a arte de tornar-se normal.
YOGA
Toda a poesia se resume
a quinhentos graus centígrados
Só os poetas julgam
ser diversamente inflamáveis.
Os que se maceram no álcool
são os primeiros a arder.
Que seriam eles sem a sua doença?
A doença é a sua saúde.
Ardem, os espantalhos de palha,
não se empanturram em Nietzsche,
o que não mata
engorda.
Fumam.
Chamuscam-se.
Mas agora só os maus iogues
queimam os seus pés
nos carvões em brasa.
A SÍNDROME DE JOB
O corpo não se reconhece mais.
De pequenos nichos na pele
ejectam-se os pequenos vampiros de olhos
fluorescentes, aos ziguezagues.
Enfermo como gastrópodes sem guelras.
Enfermo como o menir vertical
que inflama o olho da insónia.
Ao fundo mais negro do princípio,
debaixo de todas as crostas,
mesmo Job está, apesar de tudo,
agradado por estar vivo,
fora de tudo.
O ESPAÇO-TEMPO
Quando eu crescer muito, enorme, e tu
tão minguado
então -
(na teoria de Kaluz a quinta dimensão
representa-se por um círculo
conectado em cada ponto
do espaço-tempo)
- então, depois de morrer, nunca mais voltarei?
Nunca.
Nunca nunca?
Nunca nunca.
Bom. Mas nunca nunca jamais?
Não… jamais, jamais, nunca.
Estou a ver, nunca mais terei nuca.
E assim trazemos
a nossa contribuição familiar
ao problema quântico da undécima dimensão
super-gravitacional.
A PORTA
Abre a porta.
Talvez haja lá fora
uma acácia ou uma floresta
ou um jardim,
a magia duma cidade.
Abre a porta.
Talvez um cão queira entrar.
Talvez desponte um rosto
um olho
ou uma imagem
e o seu detalhe.
Abre a porta.
Em havendo nevoeiro
há-de dissipar-se.
Abre o raio da porta.
Mesmo que aí não haja
senão a cintilante obscuridade,
e que não haja para enxergar mais
que um sopro roto,
mesmo no meio
do nada,
abre a porta.
Ah, sentes
a brisa,
a passar?
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