Escreve Jaime
Gil de Biedma, no seu Retrato del
Artista en 1956, ao relatar a sua
Ida para Manila:
«Desligado do meu poema desde o passado dia 26; saí da
situação. Isso significa que chegarei ao final muito mais tarde do que pensava –
impossível trabalhar aqui durante os dias que me restam, e até que me sinta
estabelecido em Manila e possa distrair-me do mundo exterior, terá passado pelo
menos mês e meio. Ainda que sair-se da situação também tenha vantagens; vê-se
mais claramente de que lado queremos extrair o poema e é mais fácil renunciar
aos pequenos efeitos que se tinha tanto empenho em conseguir.»
Gosto da dialéctica
da distância a si (ou ao poema)
relatada
neste excerto. Leiamos a coisa ao ralenti:
abstrairmo-nos
no mundo exterior desaglutina-nos
e fica o
nosso olhar sobre o poema mais objectivo,
menos
coalhado (menos permeado pelo afecto).
O que nos permite
anular os adornos da retórica (os efeitos
adstringentes
à ideia de poema) com que o contaminávamos.
Volta aí o poema
a estar dotado de um equilíbrio instável
que lhe
empresta, a um tempo, tensão e porosidade.
É como um
enquadramento no cinema: deve tender
ao desequilíbrio,
ao off - o que importa é a sequência,
a cena, e não
o plano. Deste modo um verso alimenta-se
do desequilíbrio
do anterior, sendo um verso forte aquele
que se
estranha, obtuso a si mesmo. Implicando
isto
uma claridade
turva e não cristalina.
Metermo-nos
em situação com o poema é o primeiro acto
- o gesto de
impregnação.
Depois,
deixarmos que o exterior, o fora do poema,
crie uma
momentânea dissociação pode ser útil
porque
arranca o poema à sua estimulação auto-referencial.
O diálogo que
se instaura entre o projecto do poema e o acidente
levanta a
aragem que o descristaliza.
Descristalizar
é preciso!
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