Rafael Argullol é um brilhante ensaísta, novelista, poeta e professor de
estética, catalão, com mais de vinte livros publicados. Tive a sorte de, há
cerca de 15 anos, me ter atraído um título, o seu «El fin del mundo como obra
de arte». E nunca mais deixei de o frequentar. Sempre que um amigo vai a
Barcelona cravo-lhe um Argullol, e até agora (vou no quinto) são todos
diferentes, nunca sei exactamente o que vou encontrar quando abrir o livro. Foi
o que de novo aconteceu com «El Cazador de Instantes/ Cuaderno de travesía
(1900-1995)» que me mandou o Valério Romão. É um livro de aforismos. Aqui deixo
alguns:
Não podemos prescindir da imortalidade.
É a melhor droga contra o cansaço.
O pensamento pode permitir-se um amplo
leque de hipóteses. O sentimento só pode ser um príncipe ou um escravo.
Pode-se sempre abjurar facilmente de
todas as verdades recebidas, face à presença de uma mentira plena de amor.
As nossas ideias acerca da humanidade
informam-nos, na realidade, sobre nós mesmos. Primeiro, quando somos
grandiloquentes, entusiasmamo-nos por ela; logo, convertidos em misantropos,
odiamo-la; finalmente, já indiferentes, excluímo-la do vocabulário. Evoluímos,
nós, e não a humanidade, que nunca foi senão uma palavra que só serve para
denunciar a nossa idade espiritual.
Numa cidade estrangeira, ao balcão de um
bar desconhecido, conversando com um estranho que dentro de minutos
desaparecerá, sem vontade de voltar ao hotel e com toda a noite por diante: a
liberdade é sempre inquietante, e assim tem que ser.
Não devemos evitar as feridas que nos
produzem certos pensamentos cortantes como facas: um espírito curtido está
inevitavelmente cheio de cicatrizes.
Os bárbaros nunca existiram. São
unicamente sintomas do terror que uma civilização alberga no que respeita a si
própria.
A ressaca é o preço que devemos pagar
pela provocatória barriga cheia de certezas que manifestamos durante a
bebedeira.
Tédio: sei que acontecem muitas coisas
mas não sinto que nada esteja prestes
a suceder.
Não creio em nenhum deus. No entanto,
para esquecer-me completamente do divino teria que vir algum deus convencer-me.
Não há gente menos recomendável do que a
que alardeia continuamente a sua identidade.
Esses fanáticos não só creem que as suas choças são palácios como também estão sempre dispostos a cavar
uma tumba sob os pés dos incrédulos que os advertem sobre a sua confusão.
Sem comentários:
Enviar um comentário