domingo, 11 de novembro de 2012

MEMO DE 12 DE NOVEMBRO

                                                                           kokoschka


Dois poemas gregos, de Pandelis Prevelakis (1909-1986), perseguiram-me toda a manhã até que os verti para português, cotejando as traduções francesa e espanhola:

O CREPÚSCULO
Penetrou o crepúsculo na quinta
como um rubro leão.
O seu fulgor espalmou os espelhos,
e eu senti a tíbia planta de sua pata
sobre os meus pés nus.
Inclinei-me e, na minha mesa
abençoada pelo labor do dia,
vi que o sol me lambia os pés
com a sua linha de fogo.

A AMEAÇA
Pôs-se um falcão a planar sobre nós.
As garupas dos cavalos brilham,
a jovem mulher alçou o seu filho
e gritou: Eternidade!
Insiste, o falcão paira sobre nós.
Grito, chegou a minha vez: Eternidade, eternidade!
O que os horizontes me espantam!


Terminei hoje um artigo que me foi encomendado pelo Teatro de S. João sobre o romance Casas Pardas, de Maria Velho da Costa, e a sua adaptação para teatro por Luísa Costa Gomes. Não tenho a certeza de ter desempenhado a coisa como ambas as autoras mereciam, mas, relendo Casas Pardas fiquei com a certeza que este é um romance que só se lê na vertical e não para espairecer, ou seja, que quem não for capaz de resgatar em si a atenção que está ao fundo do canto escuro, desiste. É um romance extraordinário e muito exigente e que me deu a certeza de que a maior parte dos romances que hoje são escritos não passam do que dantes se chamavam as novelizações – pobres derivados do cinema.

De cada vez que encontrava alguém e dizia, epá, vinha a pensar em ti, a pessoa evolava-se à sua frente.
 
Philippe Sollers é um dos mais prolixos e instigantes autores franceses e entre os livros dele que prefiro estão Casanova L’Admirable, a verdadeira cartografia da insurreição que é L’Écriture et L’experience des Limites, e o seu longo diálogo sobre Dante, La Divine Comédie.
Hoje reabri o livro sobre Casanova e voltei a verificar que nunca lhe falta o desassombro, a capacidade para pensar sempre de forma politicamente incorrecta, como neste delicioso excerto: «Conhece-se o disco: se Casanova se interessa de tal forma pelas mulheres, é porque ele era, sem se confessar homossexual. De resto, essas histórias de mulheres são duvidosas. Era preciso ter a versão delas. De todas as maneiras, que procura um homem nas suas múltiplas aventuras femininas senão a imagem única da sua mãe? Don Juan, não era, no fundo, homossexual e impotente?
Fala-se muito, nomeadamente, de homofobia, mas jamais de heterofobia: é estranho.»

Aí está uma coisa em que também eu acredito piamente: Pasternak estava convencido de que só o esquecimento da sua persona ou imagem social podia abrir na sua alma o silêncio necessário para que se resgate nela a verdadeira energia da palavra.

Ouço na televisão, Temer a Deus é um sinal de sabedoria, e compreendo pela primeira vez que este temor foi a forma hiperbólica como os hebreus traduziram a necessidade de cada homem enveredar pela phrónesis grega - a moderação ou o sentimento da proporcionalidade que dimana da prudência. É apenas uma advertência contra a hybris, a desmesura, advertência aliás comum a toda a bacia mediterrânica.

 Fiquei sem net na sexta à noite, o que me impede de ler a Bola de viés, pela manhã, para me inteirar sobre os resultados do campeonato de futebol. Cada vez tenho mais dificuldade de seguir um jogo inteiro de futebol, mas gosto deste ritual matinal, onde não gasto mais do que cinco minutos, mas que me é caro. Rotinas.

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