tàpies 
 
Nasceste com a cabeça crivada de ruídos e vozes, como a velha  a quem a coluna verga a 90 graus. Assim nasceste, o apelido pendurado num prego atrás da cabeça. Nasceste e durante 9 meses desataste nós, 9 meses de atribulação num território tão vago como um mamilo. Enrolado ao teu áspero agasalho vomitado de vozes e gritos.  
 Às vezes vinha o dia e o seu ombro colava-se ao teu. Ou desfazia-se  em vapores entrecortados de gemidos, quando o teu pai, tipógrafo, intoxicado pelo chumbo exigia o indulto do amor. E tudo se acumulava, incerto e opaco,  - conhece um lugar chamado Comala? – tragados os olhos pelas íris do mundo.  
 Os rostos pareciam-te cactos onde  martela a luz - faziam plás e plás,  e mais plás - e no sangue pulsava  uma cobra, sentia-la nas frontes, como se abrisse um buraco. O corpo incomandado como um moinho estragado. E sobretudo a imensidade dos estalidos na boca de minha mãe, estando eu saciado.  
 Entre os dedos atrás do vento,  repetia o meu pai assim que lhe  indagavam sobre as suas dificuldades, eu a leste de tudo e sem saber o que fazer com o frio  que me chegava do anjinho  de gesso sobre a cómoda. Tantas as imagens que me palpavam, enquanto ia moendo no escuro as vozes e ruídos que me atravancavam desde nascido, o fardo que se paga por um metro de locomoção.  
 E um dia, como se rebentasse perto da cabeça um desses foguetes de aldeia, acordei em silêncio – uma luz transparentava a minha mãe -  e ágil soltou-se-me a primeira vogal. cada um face ao ondear dos dias, vale-se do que pode. Tens  de te conformar, avisou a minha avó. E vi uma pomba desprender-se da tarde.  | 
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